quarta-feira, 9 de junho de 2010

Carta

Pode ser que nunca mais eu consiga escrevê-la.
Digo, pois, que triste e pobre é o momento que agora sobrevivo.
Que todo ar que respiro me incomoda e a dura espécie de contentamento que por ventura recebo, vem das realizações incompletas do meu ser frágil, soberbo e desatento no saber.
Queria que soubesses do sofrimento mudo e cego que continuo a carregar nas minhas entranhas. Tu, mais do que os outros há de saber que se passo até hoje com este agouro impingido em meu sangue, não poderei me libertar jamais do prazer deste desprazer. E se me permitir com a licença, com a licença poética, confirmo que o perdido continua escondido no fundo de meu ser revés e que para dar vazão aos sentimentos, troco cada lágrima engolida por uma letra escrita. Medirás o tamanho de minha dor? Já nem eu sei o que hoje é dor ou contentamento. Sei sim, que se consagra o meu infortúnio eterno: vagar a esperar o que nunca tive, nos braços que somente sonhei. Deito sobre ti este segredo, selando-o com um pacto de sigilo tumular. Se a vida castiga-me porque amo, não irei revidar. Amarei em silêncio e em pranto. Guardarei meu riso e meu canto, e os meus sonhos derramarei no mar.

sábado, 5 de junho de 2010


Sempre tive medo de mim mesma... mas nunca esperei ficar paralisada por tanto tempo.









Tenho os minutos que respirei você, tóxico, e eu já nem sou.

O aniversário do meu melhor amigo





Meu amigo fez aniversário. Uma festa grande. Muita farra. Ele não me convidou. Sabe que não vou a aniversários. Mas, me olhou, com uns olhos de quem pede parabéns. Desapontei-o. Por que eu lhe daria parabéns? Pos estar um ano mais velho? Por suas células estarem morrendo mais rápido? Por perder mais cabelos agora? Pela, cada vez maior vulnerabilidade a doenças? Por conseguir ficar no sofá assistindo a tv, perdendo um terço de sua vida? Por todos os dias comer a vontade em seu aconchegante lar sabendo que apenas alguns milhares de pessoas gostariam de ter pelo menos uma de suas refeições? Por assistir as eleições e não poder fazer nada pra reverter o nosso singelo quadro político? Por não ter amado com tanta força que se arrepende amargamente todas as noites antes de se deitar?Por ver pessoas destruindo o planeta, pessoas lutando pelo planeta, pessoas se anulando perante o planeta e não saber em qual dessas categorias se encaixa, tendo certeza que está em todas ao mesmo tempo? Por ter brigado com seus pais e hoje fazer a mesma coisa com seus filhos?Por ser um individuo microscópico no universo e ainda achar que pode ser interessante? Por escrever bobagens clichezadas, batidas, chatas, plagiadas, revoluções ultrapassadas, reivindicações já reivindicadas, e o mesmo velho discurso de crise existencial? Por trabalhar, pagar impostos, ter uma família descente e ainda copiar a letra do Raul pra dizer que “eu acho isso tudo muito chato, um saco”? Não! Mas eu lhe desapontei. Devíamos era chorar, lamentar, estrebuchar, exclamar e clamar, nos flagelar e martirizar sobre nossas tumbas por vindouras. E de que adiantaria? Seriamos melhores?Mudaríamos o mundo? Tola juventude, o mundo é imutável! Só nos afogaríamos em mais melancolia e culpa, e raiva e depressão e culpa, e frustração e desalento e culpa do que realmente não temos culpa.

Em um dia de verão


Talvez eu esteja errada, nem tudo precisa ser depressão. Hoje poderia ser um arco-íres, com direito a pote de ouro no final. Poderia me permitir sonhar e pensar que faço diferença no mundo. Poderia deixar todo este pessimismo, este suicídio, e me alienar só um pouquinho. Poderia fingir que não sei o que acontece com meu país, com meus vizinhos, com meus amores perdidos. Eu poderia ser o mais perfeito protótipo de comercial de margarina e dar aquele sorriso de professora velha e cínica pra vida. Sim, eu poderia achar que o que escrevo, quando eu morrer é claro, mudará o mundo. Chocará a alguns, despertará outros, inspirará ainda outros mais... Mas eu não sou pretensiosa, finjo ser modesta pra que não me odeiem, mas não sou pretensiosa! Pode até ser um tipo de espírito neo-revolucionário meio antigo demais, porque hoje tá fora de moda tomar a peito as grandes questões existenciais. Porém está na moda ser fora de moda, então acho que me encaixo aí. Mas isso tudo é tão batido, ah eu vou dormir... Não preciso mais falar sobre isto. Eu vou escrever é sobre amor que é coisa inédita! Vou escrever também sobre pais e filhos. Vou falar do oceano e das flores, das nuvens e das estrelas, e de tudo que há no céu. Eu quero me aliviar!!! Se você quiser também toma um...